Um sábio me dizia: esta existência,não vale a angústia de viver. A ciência,se fôssemos eternos, num transportede desespero inventaria a morte.Uma célula orgânica aparecendo no infinito do tempo. E vibra e crescee se desdobra e estala num segundo. Homem, eis o que somos neste mundo.
Assim falou-me o sábio e eu comecei a ver dentro da própria morte, o encanto de morrer.
Um monge me dizia: ó mocidade, és relâmpago ao pé da eternidade! Pensa: o tempo anda sempre e não repousa; esta vida não vale grande coisa.Uma mulher que chora, um berço a um canto;o riso, às vezes, quase sempre, um pranto.Depois o mundo, a luta que intimida,quadro círios acesos : eis a vida
Isto me disse o monge e eu continuei a verdentro da própria morte, o encanto de morrer.
Um pobre me dizia: para o pobre a vida, é o pão e o andrajo vil que o cobre. Deus, eu não creio nesta fantasia. Deus me deu fome e sede a cada dia mas nunca me deu pão, nem me deu água. Deu-me a vergonha, a infâmia, a mágoa de andar de porta em porta, esfarrapado. Deu-me esta vida: um pão envenenado.
Assim falou-me o pobre e eu continuei a ver, dentro da própria morte, o encanto de morrer.
Uma mulher me disse: vem comigo!Fecha os olhos e sonha, meu amigo.Sonha um lar, uma doce companheiraque queiras muito e que também te queira. No telhado, um penacho de fumaça. Cortinas muito brancas na vidraça. Um canário que canta na gaiola. Que linda a vida lá por dentro rola!
Pela primeira vez eu comecei a ver, dentro da própria vida, o encanto de viver.
Guilherme de Almeida